Estradas ruins e pedágios baratos atrapalham planos do governo

Taxação proporcional às condições das rodovias poderá ficar inviável, uma vez que 60% delas têm deficiências e 20% estão em estado ruim ou péssimo, segundo estudo da CNT

O governo federal quer atrelar o preço dos pedágios à qualidade das rodovias. A medida vem sendo estudada pelo Ministério da Infraestrutura e pode ser implementada nos processos de concessão de trechos para a iniciativa privada. 

No entanto, se for levada ao pé da letra, a ideia impedirá a cobrança em grande parte das estradas que serão privatizadas. De acordo com o mais recente estudo da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), cerca de 60% das rodovias pavimentadas brasileiras tem deficiências que prejudicam os condutores – sendo mais de 20% em estado ruim ou péssimo.
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O levantamento de dados nem sequer leva em conta trechos que ainda não foram asfaltados, com nas BR-367(que atravessa o Vale do Jequitinhonha) e a BR-163 (na região Amazônica). Com pouco recurso em caixa para fazer grandes investimentos em obras de infraestrutura, o plano do Palácio do Planalto é repassar à iniciativa privada cerca de 16 mil quilômetros de estradas em 25 diferentes trechos até o fim de 2022. 

A regra para a cobrança de pedágio ficaria diretamente relacionada à qualidade do asfalto, sinalização e condições das pistas privatizadas. Assim, rodovias não duplicadas teriam valor inferior para passagem dos usuários àqueles nas estradas de pista simples.
A intenção do governo é estimular concessionárias que administrarem as BRs a invistirem em melhorias dos trechos para poder aumentar valores cobrados dos usuários. À medida que foram feitos investimentos e obras, os reajustes nos preços podem ser permitidos pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Para este ano, a pasta da Infraestrutura prevê dois leilões de rodovias.
O primeiro, marcado para 18 de setembro, será da BR-364/365, entre o município de Jataí, em Goiás, e Uberlândia, no Triângulo Mineiro. O trecho de 437 quilômetros atravessa 11 municípios em Goiás e seis em Minas Gerais (Santa Vitória, Gurinhatã, Ituiutaba, Canópolis, Monte Alegre de Minas e Uberlândia). O investimento previsto é de R$ 2 bilhões nos próximos 30 anos de concessão.
O ministro Tarcísio Gomes anunciou no início do ano que o planejamento é também leiloar até dezembro trecho da BR-101, em Santa Catarina, mas o ministério estima que o lote só estará pronto para ser concedido ao setor privado no primeiro trimestre de 2020. Nos próximos três anos, a promessa é leiloar mais 23 trechos, entre os quais estão avançados estudos para a concessão da BR-381, que liga Belo Horizonte a Governador Valadares, e da BR-230 entre Mato Grosso e Pará.
Segundo o ministério, a modelagem dos contratos com o detalhamento sobre a cobrança dos pedágios e as contrapartidas oferecidas pelas empresas serão definidas após consultas públicas e aprovação pelo Tribunal de Contas da União (TCU). “A cobrança de pedágio somente será autorizada pela agência reguladora após as melhorias iniciais previstas no contrato”, disse a pasta por meio de nota. Sobre a concessão da BR-381, o Ministério da Infraestrutura informou que os valores das tarifas ainda estão sendo estudados e serão submetidos à consulta pública.

O sucesso dos leilões será o primeiro passo para começar a destravar melhorias no setor rodoviário, que estão praticamente paralisadas desde o início da crise econômica, em 2015, mas grande parte das BRs continuará representando perigo para os usuários. De acordo com estudo elaborado em outubro do ano passado pela CNT, cerca de 60% das rodovias asfaltadas no país apresentam problemas e, desse total, mais de 20% estão em condições péssimas ou ruins. Não foram avaliados vias federais e estaduais que sequer receberam pavimentação até hoje.
O levantamento apurou a condição de pavimentação e sinalização de 67.449 quilômetros de rodovias federais e 39.712 quilômetros de rodovias estaduais, apontando que mais da metade apresenta riscos para motoristas. “A concentração de trechos deficientes na maior parte das rodovias demanda grandes volumes de investimento, e a não intervenção de forma rápida e eficiente torna esse custo ainda maior ao longo dos anos, principalmente, devido ao uso frequente e intenso da infraestrutura precária disponível”, concluiu o estudo da CNT.
O órgão aponta melhoria considerável nas rodovias que já são administradas pela iniciativa privada. No total, 81% das vias sob gestão de concessionárias tiveram classificação ótima ou boa no levantamento. Atualmente, cerca de 10 mil quilômetros de estradas federais são operadas por empresas. Caso os leilões sejam bem-sucedidos, em 2022 esse universo alcançará cerca de 26 mil quilômetros.

A mineradora Vale teve todas as concessões de ferrovias renovadas, informou ontem o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas. Como contrapartida pela renovação, a companhia vai construir uma ferrovia no Centro-Oeste, que será transferida para a União e posteriormente privatizada. Segundo Freitas, o acordo foi fechado com a Vale em troca da renovação das outorgas e será um modelo a ser perseguido pelo governo.