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Uma pesquisa realizada no Departamento de Economia Aplicada da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/ USP) aponta que a escolaridade e a renda dos caminhoneiros brasileiros permanecem baixas mesmo após as leis da categoria e do descanso. Com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD-IBGE), o objetivo do estudo foi traçar o perfil socioeconômico dos profissionais dessa área para avaliar os efeitos da legislação após a aprovação. (confira os dados abaixo)

O estudante da pós-graduação de economia aplicada, Lucas Lima, avaliou os dados de 2002 a 2015 em todo o país, comparando também as diferenças por região e o trabalho formal e informal. O objetivo era avaliar possíveis mudanças no perfil da categoria após a aprovação da Lei do Caminhoneiro, de 2015, e a Lei de Descanso, de 2012, baseada na última pesquisa divulgada pelo IBGE.

Pesquisa da USP traça perfil socioeconômico de caminhoneiros no Brasil (Foto: Reprodução/ EPTV)

Pesquisa da USP traça perfil socioeconômico de caminhoneiros no Brasil (Foto: Reprodução/ EPTV)

Os dados gerais do período mostram que 80% dos caminhoneiros possuem entre 30 a 60 anos; 85% ganham entre um a três salários mínimos; 58% trabalham com carteira assinada e 27%, por conta própria; 58% têm ensino fundamental completo e 35%, ensino médio completo; e 43% trabalham mais do que a lei determina (44 horas semanais).

A última pesquisa do PNAD aponta que, em 2015, tinham 1.930.664 caminhoneiros no Brasil. Veja os números por região:

  • Norte: 113.054
  • Nordeste: 310.046
  • Sudeste: 901.779
  • Sul: 397.424
  • Centro-Oeste: 208.361

Renda formal x informal

Os dados mostraram que ainda existe uma grande diferença na renda dos caminhoneiros que trabalham com carteira assinada e os que circulam por conta própria. Um dos fatores que podem influenciar isso é o fato de que os caminhoneiros que trabalham sem carteira assinada tendem a circular por mais horas que a lei permite.

“Caminhoneiros que trabalham por conta própria apresentam média de rendimento mensal muito acima do que os caminhoneiros que trabalham com carteira assinada para todo o período, mas essa diferença apresentou queda”, explica Lima. “Em 2002, essa diferença chegava a quase R$ 1 mil, caindo para quase R$ 600 em 2015.”

Pesquisador Lucas Lima, da Esalq/USP, que avaliou dados do PNAD sobre caminhoneiros (Foto: Lucas Lima/Arquivo pessoal)Pesquisador Lucas Lima, da Esalq/USP, que avaliou dados do PNAD sobre caminhoneiros (Foto: Lucas Lima/Arquivo pessoal)

Pesquisador Lucas Lima, da Esalq/USP, que avaliou dados do PNAD sobre caminhoneiros (Foto: Lucas Lima/Arquivo pessoal)

Um dos fatores que também podem influenciar essa diferença, segundo o especialista, é o fato de que os caminhoneiros que trabalham por conta própria não consideram os diversos custos que o veículo tem, deixando de informar esse dado ao PNAD. “Estes custos envolvem fundamentalmente a própria aquisição do caminhão que utilizam para trabalhar, o qual, muitas vezes, é pago através de longos parcelamentos. E também há a depreciação do veículo ao longo do tempo, bem como sua manutenção”, explica.

Mas outro fator também é a elevação dos custos de transporte nos últimos anos, que muitas vezes ultrapassa o valor do frete pago aos caminhoneiros. Este último afeta diretamente o rendimento dos caminhoneiros de ambos os tipos de trabalho, impedindo a progressão financeira da categoria. Veja abaixo os dados de rendimento por região:

  • Norte: R$ 1660,00;
  • Nordeste: R$ 1470,00;
  • Sudeste: R$ 1960,00;
  • Sul: R$ 2110,00;
  • Centro-Oeste: R$ 2150,00

Veja abaixo a divisão da categoria por carteira assinada nas diferentes regiões do país:

Caminhoneiros: carteira assinada x trabalho informal

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
CARTEIRA ASSINADA 54,82% 48,39% 62,15% 60,22% 56,99%
CONTA PRÓPRIA 24,92% 28,49% 28,18% 27,12% 27,87%

Baixa escolaridade e problemas de saúde

Justamente pelas longas jornadas de trabalho da categoria, a escolaridade dos caminhoneiros continua baixa. Segundo a pesquisa, no Brasil, cerca de 60% dos caminhoneiros não completaram o ensino fundamental e 35% tem o ensino médio completo.

“Esse padrão é muito parecido para as demais regiões do Brasil, com exceção da região Centro-Oeste, na qual apenas 27% dos caminhoneiros têm ensino médio completo. A região Sul têm a maior média de anos de estudo: 8,2. Para as regiões Norte, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste, esse número é 8,1; 8; 7,8; 7,5; respectivamente”, aponta Lima.

Os caminhoneiros também ainda enfrentam sérios problemas de saúde pelas longas jornadas de trabalho. Os principais problemas estão ligados principalmente a doenças cardiovasculares e a problemas ortopédicos.

Polícia Rodoviária orienta motoristas sobre a importância do descanso após aprovação de lei (Foto: Reprodução/EPTV)

Polícia Rodoviária orienta motoristas sobre a importância do descanso após aprovação de lei (Foto: Reprodução/EPTV)

“Segundo estudos, esse problema [de pressão arterial elevada] está muito ligado ao uso da anfetamina, que é muito comum entre os motoristas de caminhão, popularmente conhecida como ‘rebite’. Essa substância é utilizada para que os caminhoneiros aguentem as longas horas na estrada, já que é inibidora de sono”, explica Lima.

Já os problemas ortopédicos costumam aparecer com o tempo. “Após 10 ou 15 anos dirigindo sob jornadas de trabalho exaustivas, problemas como tendinite e contraturas musculares são muito comuns entre esses profissionais”, completa.

‘Lei do Descanso’

Segundo o especialista, no período, houve uma redução de cerca de 10 horas na jornada de trabalho da categoria, inclusive influenciada pela “Lei do Descanso”, que determinou 44 horas semanais para os caminhoneiros, mas os motoristas ainda continuam dirigindo por mais tempo do que determina a lei.

“Em 2002, a média de horas trabalhadas por um caminhoneiro no país era de 55. Em 2015, esse número caiu para 45. Entretanto, continua acima do máximo estabelecido pela Constituição Federal, que é de 44 horas semanais. Outro número importante é o desvio-padrão dessa média, que é 12. Isso significa que há muitos profissionais que ainda trabalham numa jornada semanal exaustiva.”

Mas um efeito colateral apontado pela pesquisa da “Lei do Descanso” foi a diminuição do rendimento desses profissionais, que teve queda de aproximadamente R$ 70 mensais.

“Esses resultados são extremamente importantes de serem visualizados pelo gestor público para que as leis sejam alteradas, ou mesmo para a elaboração de nova legislação”, finaliza o pesquisador.